O refúgio dos caiçaras A poucos quilômetros do Rio, o deslumbrante cenário do Aventureiro

Fotos de Custódio Coimbra e texto de Cristina Chacel

O cenário é deslumbrante. Duas praias de águas cristalinas, azul-turquesa, areia branca e fina, um morro rodeado de costões e duas lagoas emolduradas por uma mata verdíssima. Estamos na Reserva Biológica da Praia do Sul e do Leste, na Ilha Grande, unidade de conservação criada por decreto estadual em 1981 e que abriga a comunidade caiçara do Aventureiro, inicialmente vista como um obstáculo, uma vez que, em reservas, o bicho homem não entra.

A solução encontrada para superar o conflito social e acomodar a convivência com a comunidade tradicional foi transformá-la em Reserva de Desenvolvimento Sustentado (RDS). A do Aventureiro foi a primeira do Rio de Janeiro. Nesta condição, o Estado é o dono do território e os moradores tem a propriedade das casas, com restrições: não podem vendê-las, exceto para outros caiçaras da mesma comunidade ou para o próprio Estado. Com isso, no curso do tempo, é possível imaginar que o poder público acabe dono de tudo e o Aventureiro não exista mais.

Se não podemos adivinhar o futuro, o passado indica um outro grande valor da área conservada da Ilha Grande, que remonta a três mil anos, quando pescadores coletores e caçadores se apossaram do Ilhote do Leste – localizado no coração da reserva. Lá, eles montaram uma verdadeira fábrica de machados, chegando a produzir milhares desses objetos que foram “exportados” para o resto do Brasil. Essa história está contada na tese da professora Maria Cristina Tenório, publicada no livro Ilha Grande: do sambaqui ao turismo, organizado pela professora Rosane Manhães Prado, que leva o selo da Editora Garamond.

A pesquisa no Ilhote revelou a existência de quase três metros de acúmulos de material arqueológico composto por restos alimentares, artefatos e sepultamentos, além de dezenas de amoladores-polidores - conjuntos de rochas que apresentam sulcos formados pela ação do homem na elaboração de objetos polidos. Eram lâminas de machado feitas a partir de seixos encontrados dentro dos riachos que desembocavam nas praias.

Além do Ilhote, os vestígios desses amoladores-polidores foram descobertos em quase todas as praias da Ilha que apresentam pequenos cursos d’água. Estima-se que foram produzidos pelo menos 278 mil instrumentos. A defasagem entre o total de lâminas de machado encontrado na Ilha e a quantidade estimada permitiu a construção da hipótese de que a Ilha Grande seria um centro de distribuição desse artefato.

“Decorridos três mil anos, a presença dos fabricantes de machados da Ilha Grande ainda pode ser vista através das marcas na paisagem que nos contam a história de um povo”, narra a pesquisadora.

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