As gotas da polêmica Imagens premiadas no World Press Photo reacendem o debate sobre fotojornalismo

Texto de Marizilda Cruppe com as fotos vencedoras do World Press Photo 2016

Não tem erro. O anúncio dos vencedores do World Press Photo sempre provoca algum debate. Desta vez, a polêmica girou em torno de uma história contemplada com o terceiro lugar na categoria “People” e que foi retirada do concurso. Não pela Fundação World Press Photo, mas pela agência de notícias americana AP (Associated Press), para a qual o fotógrafo espanhol Daniel Ochoa de Olza, autor das fotos, trabalha.

A imagem registrada pelo fotógrafo australiano Warren Richardson foi eleita a melhor de 2015. Ela mostra um bebê de família migrante sendo passado por baixo de uma cerca de arame farpado na fronteira entre a Hungria e a Sérvia
Na imagem maior, a manifestação contra o terrorismo na França, de Corentin Fohlen. No detalhe, a violência em Honduras, registrada por NIclas Hammarström, da Suécia
Os conflitos na Síria, registrados pelo sírio Sameer Al-Doumy

Para os não iniciados em fotojornalismo, o World Press Photo é muito mais do que um concurso. Por trás da premiação, existe uma fundação holandesa, de mesmo nome, que há 59 edições organiza a competição de maior prestígio e repercussão mundial.

Além de workshops, cursos intensivos de aperfeiçoamento e seminários, ela publica livros e influencia o mercado com os resultados do seu trabalho, totalmente dedicado ao fotojornalismo. Anualmente, a exposição das fotos premiadas é vista por mais de 3,5 milhões de pessoas, em cerca de 100 países, incluindo o Brasil.

Avalanche no Nepal, por Roberto Schmidt, da Alemanha

As imagens em questão - uma delas abre esta galeria - são registros de fotos das vítimas dos ataques ocorridos em Paris, em novembro de 2015, expostas nos memoriais que as homenageavam. As fotografias de Olza mostram as fotos das vítimas cobertas por gotas de chuva.

Na imagem maior, refugiados na Turquia, feita por Bulent Kilic. Na menor, uma explosão na China, de Chen Jie.

Fora do Brasil, o debate pegou pelo lado do direito autoral. As fotos seriam de Olza ou seriam reproduções? Por aqui, levantou-se a bola do uso da linguagem. Isso pode ser qualificado como fotojornalismo?

A foto de crianças indígenas brasileiras saltando das árvores num rio foi eleita a 2ª melhor na categoria 'Vida Diária' . Ela foi feita pelo brasileiro Maurício Lima para o The New York Times

A AP, num comunicado divulgado na sexta-feira, dia 19, pelo vice-presidente e diretor de Fotografia, o americano Santiago Lyon, alegou que “as fotos foram inscritas por um erro”. A política da agência para a reprodução de fotografias tiradas “por outros” não permitia a inscrição no concurso.

Refugiados chegando à Europa, do russo Sergey Ponomarev, é a foto maior. No detalhe, um registro dos conflitos na Síria, feito por Abd Doumany.
Terremoto no Nepa, por Daniel Berehulak, da Austrália.

Nascido em Pamplona, Daniel, 37 anos, começou a trabalhar para a AP em 2005 e é fotógrafo contratado desde 2009. Ele tem um interesse especial pela etnografia e já recebeu diversos prêmios, entre os quais o Pictures of the Year Internacional, um World Press Photo, em 2013, e mais dois na edição deste ano.

Não é pouca coisa. O concurso recebeu 82.951 fotos, de 5.775 fotógrafos, de 128 países. Os 19 jurados, 11 homens e oito mulheres, de 16 nacionalidades, reuniram-se em Amsterdã durante três semanas para chegar às imagens vencedoras, divulgadas na última quinta-feira, dia 18.

Os dois principais prêmios na categoria Esportes foram para Christian Walgram, da Áustria (foto maior) e para Greg Nelson, dos Estados Unidos

Com 7 bilhões de habitantes e 3 bilhões de telefones celulares circulando pelo planeta, um em cada três cidadãos tem certeza de que é fotógrafo. Só no Instagram, em janeiro, foram publicadas mais de 80 milhões de fotos - por dia!

Zhang Lei, mostra a poluição na China
Registro de menino preso no Senegal, feito pelo português Mário Cruz

Com esse volume de uploads, quase 4 milhões de fotos por hora, em apenas uma das redes sociais, o fotojornalismo está longe de morrer. O fotógrafo americano e professor da Universidade de Yale Philip-Lorca di Corcia disse: “Fotografia é uma língua estrangeira que todo mundo pensa que fala”.

Imagem de uma criança coberta por uma capa de chuva à espera em fila de registro de refugiados em um campo de Presevo, na Sérvia, foi eleita melhor foto na categoria 'Pessoas'. Foto: Matic Zorman, da Slovenia

Ele tem razão. Todo mundo pode "ler" uma fotografia, mas "falar" através dela, só fotógrafos profissionais como Daniel Ochoa de Olza, os demais premiados no World Press Photo, em outros concursos sérios e os tantos ótimos fotógrafos sem prêmios que batalham por aí.

A formação de uma nuvem negra que mais parece um tsunami, em Bondi Beach, na Austrália, foi registrada por Rohan Kelly. Já o orangotango foi clicado pelo americano Tim Laman

Daniel conseguiu enxergar no universo tumultuado de uma cobertura de grande porte, como a dos ataques em Paris, a delicadeza das gotas de chuva sobre as fotos expostas nos memoriais – que estavam lá porque os parentes das vítimas queriam que elas, as pessoas queridas que eles perderam, fossem lembradas. É preciso ter olho para ver. E isso é fotojornalismo.

Christian Bobst, da Suiça, fez esta foto no Senegal
A China vista pela câmera de Kevin Frayer, do Canadá.
Série que mostra histórias de mulheres que foram vítimas de estupro ou violência sexual durante o serviço militar nos EUA levou o 1º lugar na categoria 'Projetos de Longo Prazo' . A imagem é de Mary F. Calvert, dos Estados Unidos

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