Munduruku, os Cortadores de Cabeça

Texto e fotos de Anderson Barbosa

Eles ainda mantêm muito dos seus costumes, sua língua, seus rituais, enfim, sua cultura intacta. Exceto a prática que os transformou num dos povos indígenas mais temidos da Amazônia: a de cortar a cabeça dos inimigos tombados em guerras. Hoje, como alguns dizem, "... estão amansados", mantêm uma postura diplomática e estratégica na política e em suas ações para chamar a atenção da população brasileira e mundial sobre os grandes empreendimentos na Amazônia que impactam a cultura da nação Munduruku.

Ao todo, são aproximadamente 14 mil indígenas que vivem ao longo da bacia do Tapajós. Sua história de resistência começou no século XVII, nos conflitos com os chamados Pariwat (não índios), que incluía colonos de várias partes e soldados das tropas portuguesa. Os Munduruku foram exaustiva e imoralmente usados pelos portugueses no processo de ocupação da região. Guerreiros natos, eliminavam seus adversários, majoritariamente outros indígenas, e suas cabeças eram mumificadas e transformadas em troféu.

Séculos mais tarde, após os primeiros contatos com o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), hoje FUNAI, outros conflitos passaram a acontecer na região onde vivem os Munduruku. Mesmo com a presença de agentes da FUNAI, a invasão do território por exploradores de madeira, palmito e garimpeiros de ouro e diamante são recorrentes. Atualmente, o maior inimigo do povo Munduruku é a política desenvolvimentista do governo, que envolve a construção de portos para o escoamento de soja, hidrelétricas e mineradoras em praticamente todos os rios da Amazônia.

Um destes projetos é a Usina Hidrelétrica de Tapajós, prevista para ser construída nas proximidades do município de Itaituba, oeste do Pará. Ali estão localizadas nove aldeias, todas Munduruku. A eventual construção da usina, que teve a sua licença de construção recentemente negada pelo Ibama, impactaria a caça, a pesca e a cultura indígena.

Hoje, no entanto, eles trocaram as guerras do passado pelas visitas às comunidades ribeirinhas e de pescadores para falar dos riscos que estes grandes empreendimentos causarão na vida das pessoas. Eles reivindicam a demarcação e homologação das terras conhecidas com Sawre Muybu há cerca de 14 anos. Trata-se de uma área com cerca de 180 mil hectares.

Em outubro de 2014 os Munduruku iniciaram o processo de autodemarcação, contando com guerreiros e guerreiras do médio e do alto Tapajós. A operação durou cerca de seis meses, dentro da área tomada por madeireiros, garimpeiros e palmiteiros que exploram a região sem qualquer fiscalização dos órgãos ambientais do Estado. Os indígenas continuam mobilizados aguardando um parecer favorável e a demarcação definitiva do território.

A demora na publicação do relatório se deve ao interesse do governo nos recursos hídricos e minerais da bacia do Tapajós. De acordo com o Artigo 231 da Constituição Federal, é proibida a remoção definitiva de populações indígenas de territórios reconhecidos, demarcados e homologados. Nesta área estão alguns dos locais mais sagrados para os Munduruku, conhecidos como Karubixexé (para onde vão os mortos) além de Daje Kapap (Travessia dos Porcos), área onde, de acordo com a crença da criação dos Munduruku, Karosakabu transformou humanos em porcos e tentou aproximar as duas margens do Tapajós para que eles atravessassem.

No início de abril, cerca de 550 indígenas de várias aldeias do alto Tapajós participaram da 26ª Assembleia Geral do povo Munduruku, na aldeia Kato, localizada no rio Kabitutu, afluente do Tapajós e uma das mais antigas e populosas aldeias Munduruku do alto Tapajós. Durante o evento eles discutiram questões como saúde e educação indígenas, organização social, a fragilidade da FUNAI (Fundação Nacional do Índio) e, principalmente, a proposta de construção de 42 hidrelétricas na bacia do Tapajós.

Ao final eles divulgaram uma carta, endereçada ao povo brasileiro e ao governo. Nela, eles falam sobre a relação com o rio, com a floresta e fazem uma lista de reivindicações:

- Não queremos nenhuma hidrelétrica em nossos rios.

- Exigimos a demarcação da Terra Indígena Daje Kapap Eipi, conhecida pelos pariwat como Sawre Muybu.

- A não realização do leilão da Usina de São Luiz do Tapajós.

- Interromper os projetos de construção de novas hidrelétricas nos rios Tapajós, Jamaxim e outros rios da Amazônia.

- Parar a construção da Usina Hidrelétrica de São Manoel.

- Fortalecer a saúde indígena, respeitando a medicina tradicional.

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